quinta-feira, 7 de março de 2013

A invasão dos prédios

Vista do Alto Mundo Novo - Imagem by Google 12/2011
Lembro que, quando menino, subia o Alto 13 de maio e de lá via os aviões descerem até quase tocar a pista do Guararapes. Via muito mais. Os municípios vizinhos se revelavam à noite por um amontoado de luzes no horizonte, Camaragibe, Olinda (altos), Jaboatão (URs), o mar...

Hoje, subindo a ladeira, o panorama é diferente. Há uma nítida invasão de prédios que marcham impolutos em direção ao subúrbio ocultando a vista do horizonte.

Se por um lado há maior oferta de imóveis e estabelecimento de novos comércios, por outro, há um tumulto crescente com mais automóveis, menos lugares nos ônibus, mais trânsito engarrafado, mais esgotos estourados, maior valorização do m², menos áreas verdes, mais calor, menos mangueiras, menos espaços nas calçadas, mais filas, menos memória.

Somente no entorno do Mercado de Casa Amarela, cerca de 30 construções de grande porte podem ser contadas, fora as tradicionais casas e casarões que já estão desocupados e até em demolição, à espera do início de mais uma obra.

Nada contra o progresso ou a modernização. A paisagem da foto até ficará mais elegante, todavia, a questão é outra.

O perfil do bairro e adjacências muda, mas muda de forma desordenada pois não há um estudo de impacto nem melhorias urbanas pensadas para o futuro. Os governos se sucedem e nada de novo acontece.

Quem, ao comprar imóveis nos primeiros prédios construídos nesta recente leva de empreendimentos buscou a tranquilidade do subúrbio, com suas tradicionais ruas arborizadas, quintais cheios de fruteiras e ambulantes que ainda vendem frutos e raízes à moda antiga, está percebendo agora uma nova corrida como a que aconteceu nos anos 30 e 40 do século XX, quando o Programa de Erradicação dos Mocambos e a Liga Social Contra o Mocambo empurrou para Casa Amarela (Areia Branca, Alto do Mundo Novo, Morro do Arraial e demais morros) um contingente de "desabrigados" que aqui começaram a erguer suas casa no meio dos matos e restos do Engenho São Pantaleão do Monteiro, junto a nascentes de águas (como as do Córrego do Botijão e no Vale do Mundo Novo) e próximo à linha dos trens e bondes até tornar-se, décadas após, no maior bairro do Recife, quase município, com projeto para emancipação vetado nos anos 1980 e depois, como que por castigo, dividido em 10 outros pequenos bairros.

O resultado é que aqui teremos em breve um caos estabelecido no caos maior em que está se tornando o Recife, pois a demanda por serviços aumenta exponencialmente e a oferta e ofertantes tendem a se estabelecer de forma incompatível com política engessada da urbis, assim, atravessando a Lei e construindo-se, tacitamente, um outro modo de favela.

Condomínio na Macaxeira - Imagem by Google 12/2011
Mas ainda vejo outro tipo mudança: esta diz repeito à vida espiritual. Com a verticalização das moradias, mais difícil é o acesso à evangelização porta-a-porta, que, paradoxalmente, iniciou-se organizadamente em nossa igreja exatamente aqui em Casa Amarela, com a Campanha Evangelizadora. Da guarita poucos passam para o enfurnamento que é o mundo dos condomínios privados.

É o tempo de todos testemunharem onde estiverem. De se buscar e usar todas as demais formas de comunicação (enquanto é tempo).

Novos tempos, novos desafios para a Igreja e para o cumprimento do "Ide" de Jesus Cristo.

Para saber mais:
FALCÃO, Joaquim de Arruda & SOUZA, Maria Angela de Almeida (1985) Mocambos do Recife. O Direito de Morar in Ciência Hoje. Especial Nordeste. Revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, vol. 3, n.º 18, maio-jun, p.74-80
CAVALCANTI, Daniel, Uchoa. Alagados, Mocambos e Mocambeiros. Recife: Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisa Social / Imprensa Universitária. 1965
Ambos disponíveis em partes ou citações em consultas na internet.

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails