Em nosso país temos a tendência de andar em movimentos pendulares, isto é, de um extremo ao outro. Decididamente equilíbrio não é a palavra favorita dos evangélicos brasileiros. E quando alimentamos nossas opiniões com “supostas” convicções teológicas feitas sem exegeses e hermenêuticas corretas, andamos apenas atrás de “movimentos”, “percepções” ou experiências baseadas em “revelações pessoais” muito questionáveis.
E em nosso contexto então, na área da adoração e música, estas frágeis convicções aportam aqui, ganham espaço e terreno em nosso meio, alimentados pela mídia e que, somados aos conceitos culturalmente importados impregnados em nossas instituições teológicas, cerceiam, inibem e reduzem as possibilidades de usarmos a música e a arte para a expansão do Reino de Deus.
Uma das prejudicadas nestes extremos do pendulo no Brasil foi e tem sido sem dúvida o canto coral, confundido por muitos com o chamado conceito de “música especial”. “Morte a este conceito”, defendem e pregam alguns ministros de louvor, para não deixar o “ego” brilhar e o foco artístico estar sobre pessoas. Mas ninguém fala do “ego” ou o identifica naquele que fica ministrando com a luz e o foco somente nele, em suas “viagens manipulativas” de profetismo, levando o povo a distorções. Parece que aquele ou aquela pessoa está “imune” ao pecado ou ao desejo de roubar a glória de Deus. Falsa e enganosa espiritualidade.
E mais, conspiram contra o conceito da excelência no que se faz ao Senhor, negando o valor do trabalho organizado, da disciplina em servir através do estudo da música e da arte, e do ensino e musicalização ao povo de Deus para o adoramos melhor e pregarmos o seu evangelho. Precisamos largar de sermos indisciplinados, preguiçosos, arrumar desculpa esfarrapada para nossa carnalidade e negligência em fazer o melhor para o Senhor. Tanto o coração transformado e conhecimento de Deus, mas também adorando e ministrando em beleza estética e artística. Ou é o Diabo que vai sempre merecer o melhor dos homens criados à imagem e semelhança de Deus, como nos questiona C. S. Lewis? Integridade sim, mas também excelência! Este é o equilíbrio na adoração e serviço a Deus.
Até nossos hinários foram respingados por esta tendência reducionista, e vivemos quase o abandono em nossas igrejas locais de hinos edificantes que foram compostos por gente de Deus séria e inspirada, e arranjados para quatro vozes para serem cantadas pela congregação e coros menores. Além disso, são registros da ação de Deus na história da igreja, rica herança a ser preservada.
Ministros de música formados por instituições de ensino denominacionais foram sendo desprezados, curtindo situações de desemprego e falta de perspectiva em servir a Deus nesta área tão importante e estratégica para o crescimento da igreja e cumprimento de sua missão. É igualmente verdade que falta uma teologia de adoração mais consistente na formação dos ministros de música, que tem a tendência somente a um conhecimento técnico, educação musical e aprender a fazer a liturgia de cultos.
Movimentos de valorização e desvalorização do canto coral aconteceram na história, desde os cristãos da igreja primitiva que incentivaram a música congregacional amadora, porém rica e séria, e continuando a partir do século V num culto público altamente desenvolvido e elaborado artisticamente, tendo na Reforma momentos de abolição e restrição do canto coral por se enfatizar o sacerdócio de todos os crentes. Enfim, são movimentos cíclicos e pendulares.
A música coral tem embutida inicialmente uma idéia básica congregacional e participativa, isto é, um pequeno ou grande grupo reunido forma um coro e que amplia sua possibilidade em ministrações de cultos públicos e trabalhos mais específicos e elaborados. Na história da adoração judaico cristã, o canto coral tem esta finalidade básica a exaltação e manifestação da glória de Deus por cada indivíduo e pelo povo quando reunido para a adoração pública. Miriã dirigiu um grupo coral de mulheres no louvor, Davi organizou este serviço de adoração e culto com muitos cantores e músicos dirigindo a adoração no templo, e com o caráter sacerdotal. Todo o trabalho era simultâneo a uma consistência na espiritualidade dos levitas.
Considerados indesejáveis ou desnecessários na adoração brasileira, apesar de muito comum em nossa realidade, ainda se valoriza em pleno século XXI os coros e o canto coral para a adoração a Deus. São motivados e impulsionados pelo grande avivamento do século XIX, quando foram consideradas manifestações contínuas ao trabalho e ministério do ensino, do púlpito. A música criativa e elaborada do canto é e será sempre serão instrumento válido de adoração e evangelização e que precisa ser resgatada em nossa realidade. A visão de João no Apocalipse confirma e prenuncia esta importância para homens ao redor do Trono de Deus vindo de todas as nações, e também aos anjos.
O canto coral faz parte fundamental da necessária formação de um povo, de uma nação, inclusive do povo de Deus, povo de Sua propriedade exclusiva, como escreve Pedro (1 Pedro 2.9), para proclamarmos as virtudes daquele que nos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz, isto é, para adoração de Seu nome!!!
Sou grato a Deus porque no início de minha conversão, roqueiro novo convertido, fui colocado para cantar primeiro tenor num coro jovem e num coro de uma igreja batista. E comecei uma jornada de cantatas inspiradas, de contato com partituras, de comunhão e entrosamento com irmãos, de entrosamento na igreja local, de oportunidades de colocar os talentos para Seu serviço e aprender a canalizar para a Sua glória tudo o que fazia e criava. A herança do canto coral, dos spirituals, do gospel, é fantástica, mesmo na realidade secular como nos ensina a história.
Nas gravações que tenho participado cantando várias vozes, nos grupos que participei, nos falsetes dos jingles, vejo a escola que foi para mim o canto coral. Oportunidade que tenho de adorar melhor, na compreensão maior de que a adoração envolve meu estilo de vida, sendo a arte parte dela. Que possamos resgatar a arte e a educação musical em nossas igrejas, o rico canto coral, a música instrumental, para a adoração e para a pregação da mensagem do evangelho em tantos espaços culturais abertos em nossas cidades.
Sou grato a Deus pelo ministério do Dr. Eduardo Spann, Dick Torrans, Almir Rosa, Vencedores por Cristo, maestro Willians Costa Júnior, que não me deixaram perder de vista esta rica dimensão da adoração e, reconheço também desde Mahalia Jackson, Andraé Crouch, Danibelle, ao atual, criativo e elétrico Kirk Franklin, a seriedade e cuidado em resgatar através de suas ministrações, shows, gravações e DVDs, a importância da música e canto coral na adoração e pregação do evangelho.
Meu agradecimento aos ministros de música do Estado do Espírito Santo (estado que tem o maior número de ministros de música), onde passei recentemente ministrando em várias igrejas, vendo e me emocionando com crianças cantando juntas e tocando suas flautinhas, meninos em orquestra de violões, em coros adultos juntos com a congregação, cantando e louvando de forma tão bela, vigorosa e com tanta arte, para a exaltação da glória de Deus e testemunho de Seu maravilhoso evangelho.
Construção de relacionamentos, a comunhão com Deus e os irmãos, a oportunidade para servir, a sociabilização fraternal, a entrega dos egos para a transformação pessoal debaixo do senhorio de Cristo, o crescimento em humildade pelos elogios que se recebe, canalizando a glória a Ele, reconhecendo o poder capacitador e criativo de Deus em nós, crescimento da igreja local, e ministração ao povo de Deus e educação musical e adoração, são alguns dos benefícios desta área.
Que o caminho do equilíbrio, isto é, a integridade na adoração no coração e vida, aliada com a excelência com que se prepara para adorar através da música e arte, sejam características marcantes das vidas e ministérios daqueles que estão servindo, cantando, tocando e fazendo arte para a glória de Deus e testemunho de Sua salvação. Ministros de louvor e música, ênfases que se completam para o serviço e adoração ao nome de Jesus!!! Que o Senhor nos ajude no caminho da maturidade nesta área.
Fonte: Nelson Bomilcar
Nelson Bomilcar é compositor e cantor. Foi integrante do Vencedorespor Cristo e da Aliança Bíblica Universitária do Brasil. Formado em teologia pela Faculdade Batista de São Paulo e pelo Regent College de Vancouver (Canadá), pastoreou diversas igrejas no Brasil, especialmente na região Sudeste onde mora. Atualmente dá palestras sobre música e adoração.
2 comentários:
Julio musicaos wrote (via Multiply) on Nov 1
Muito boa suas colocações, parabens!
Graças a Deus que ainda existem homens de Deus que possui a seiva Adoradora no Espírito por isso ainda creio numa dimensão coesa de Equilíbrio entre Conscientização e a Musicalidade, boa matéria.
Kleyber Santiago
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